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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Argentina já condenou 262 repressores da ditadura

A recente decisão da Justiça argentina que condenou à prisão perpétua 16 ex-oficiais da Marinha, no caso do centro clandestino que funcionava na Escola de Mecânica da Armada (ESMA), entre eles o repressor Alfredo Astiz, é parte de um amplo processo judicial em nível nacional e de políticas de Estado de extraordinário significado histórico. Segundo dados oficiais, até hoje, 262 repressores foram condenados pela justiça e 802 são alvos de processos em curso. O artigo é de Francisco Luque.

Francisco Luque - Correspondente da Carta Maior em Buenos Aires
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A recente decisão da Justiça argentina que condenou à prisão perpétua 16 ex-oficiais da Marinha, no caso do centro clandestino que funcionava na Escola de Mecânica da Armada (ESMA), entre eles o repressor Alfredo Astiz, é parte de um amplo processo judicial em nível nacional e de políticas de Estado de extraordinário significado histórico.

Após as graves violações de direitos humanos cometidos em um regime de terrorismo de Estado durante a última ditadura militar (1976-1983), o Estado argentino impulsionou a reparação judicial desses delitos mediante a elaboração de processos sustentados na criação de suas próprias leis, tribunais e políticas públicas. A isso se somou o forte envolvimento das vítimas, familiares e sociedade civil, bem como o respeito aos compromissos internacionais derivados de tratados de direitos humanos aos quais a Argentina aderiu.

Trata-se de um processo paradigmático que tem buscado julgar os crimes praticados na época em que a perseguição política e ideológica, o sequestro e a desaparição de pessoas, bem como a existência de centros clandestinos de detenção e extermínio, a apropriação de criação e o exílio eram parte de um plano rigorosamente orquestrado pela ditadura.

Pablo Parenti, coordenador da Unidade de Coordenação e Acompanhamento das causas envolvendo violações de direitos humanos, do Ministério Público Federal, sustenta que os processos judiciais por delitos de lesa humanidade se dão no marco de uma política ampla de Estado que tenta dar uma resposta jurídica às demandas das vítimas e familiares. Essa vontade política se refletiu na criação de uma unidade independente, cujo objetivo tem sido impulsionar a demanda por justiça, assim como reordenar o turbilhão de informação coletada e direcionar as causas judiciais que se desenvolvem em todo o país.

Segundo dados oficiais dessa unidade, até hoje, 262 repressores foram condenados pela justiça e 802 são alvos de processos em curso. Destes, 400 já têm imputadas algumas causas.

Com respeito à cobertura da justiça, Parenti sustenta que estão sendo realizados julgamentos em praticamente todas as províncias do país. Ainda que existam problemas como a inabilitação de juízes por desempenho duvidoso ou o entorpecimento por parte de alguns funcionários, o advogado assinala que os processos se desenvolvem com a normalidade própria da situação. São transparentes e públicos. Só em 2011, os processos por lesa humanidade levaram a juízo 119 pessoas.

Outro processo a se destacar é o aprofundamento das causas. À tipificação de delitos de tortura, desaparecimentos e apropriação ilegal de crianças, se somaram causas por violência sexual e cumplicidade de funcionários do Judiciário e/ou civis. Esses avanços são parte de uma estratégia processual que busca avançar na imputação dos acusados.

Uma das táticas desta nova estratégia processual tem a ver com a realização de investigações que unifiquem as causas por meio da figura do “centro clandestino de detenção”. Esse plano permitiu acelerar os trâmites de processos e levar uma maior quantidade de pessoas ante a Justiça. O caso da ESMA e do Centro Camps, da cidade de La Plata, são parte dessa estratégia.

Esta realidade, sustenta Parenti, não teria sido possível se, nos últimos dez anos, não houvesse vontade social e política de corrigir o caminho desenhado pela política da impunidade (Leis do Ponto Final e da Obediência Devida), instaurada no final dos anos 80. De 2003 em diante, começaram a ser implementadas uma série de medidas para facilitar o trabalho da justiça, como a promulgação da lei de nulidade e a renovação da Corte Suprema.

Além disso, a decisão pela imprescritibilidade de delitos no marco do julgamento do repressor chileno Arancibia Clavel, julgado em Buenos Aires pelo atentado contra o general chileno Carlos Prats, em 1974, e a decisão que julgou inconstitucional o indulto de processados por esses crimes, foram outras medidas importantes desse processo.

E a justiça continua. Nos últimos dias, Juan de Dios Daer e Edgardo Aroldo Otero, repressores da ESMA, foram detidos logo depois de terem siso liberados da prisão pela Câmara de Cassação Penal. Ambos são acusados de crimes contra a humanidade que teriam sido cometidos no centro de detenção.

A esses casos se soma a detenção de 15 repressores relacionados com o centro clandestino de detenção ‘Ponte 12”. Vários deles já tinham outras acusações de violações de direitos humanos, como ex-comissário de polícia de Buenos Aires Miguel Etchcolatz, os ex-agentes de inteligência Eduardo Ruffo e Raúl Guglielminetti, e os militares Hugo Idelbrando Pascarelli, Federico Antonio Minicucci e Faustino José Svencionis.

Por outro lado, a Câmara Federal portenha ratificou o processo contra a esposa de um repressor que entregou um bebê filho de uma desaparecida, nascido na ESMA, a uma amiga para que o registrasse como seu. Inês Graciela Lugones, ex-esposa do falecido tenente coronel Guillermo Minicucci, foi considerada “coautora do delito de retenção e ocultação de um menor de dez anos”. Segundo consta do processo, Lugones teria entregue o bebê, filho de Liliana Carmen Pereyra e Eduardo Cagnola, ambos detidos ilegalmente na ESMA e desaparecidos, para o casal formado por Jorge Ernesto Bacca e Cristina Mariñelarena, que também estão sendo processados.

Tradução: Katarina Peixoto
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